O pedinte
.
- Ei, cara! Você me pediu esmola há pouco, na porta do banco. Tá aqui, bebendo cerveja numa boa
- Eu?! Assim o senhor me ofende, professor. Por favor.
- Como não?! Me lembro bem da sua cara, rapaz. Você é um falso pedinte, fingindo necessidade. E eu, bobo, coração mole ... você devia ser preso, safado.
- Doutor, o senhor está me insultando.
- Então, o que você me diz, canalha? O-que-vo-cê-me-diz?
- Procure entender, autoridade. Eu sou ator. O senhor já viu o Herrison Ford... o senhor sabe quem é ... o Indiana Jones. O senhor acha que ele é arqueólogo? Ele é ator, excelência, e ganha milhões. De dólares, majestade ... fingindo. Eu finjo ser mendigo ... só isso. Não tenho direito a cachê, nem tenho produtor, diretor, essas coisas - ainda. Recebo a bilheteria diretamente. Sabe como é. Assobio e chupo cana.
- Mas o Indiana Jones é do cinema. E você, seu pedinte de araque.
- Sou ator de rua, doutor. Mambembe.
- Bonito, rapaz ... você me enganou ... é isso.
- Sou razoável, meu rei. Bonito mesmo é o Rodrigo Santoro. Que, aliás, ficou famoso e rico fingindo ser louco. Louco e bicha – coisa horrorosa, vocês não acham?
- É, mas lá se tratava de ator consagrado. E você, quem é?
- Sou aspirante, meu ídolo. E feio, fazer o quê. Mas o Grande Otelo; o senhor sabe quem foi Grande Otelo? Um cara feio pra cacete, que fez papéis engraçadíssimos e virou celebridade.
- Além de ator – de intérprete, não, de falso comediante, ainda é bom argumentista.
- Obrigado, companheiro, nada melhor do que ser reconhecido profissionalmente. Vejo que você também engana. É do ramo e eu duvidei de sua arte.
A esta altura, o debate que se iniciou como uma repreensão, resvalou por uma briga com xingamento e ia se encaminhando para um acordo, já tinha uma platéia de não sei quantos. Sabe como é cidade grande. Tem sempre platéia para o bizarro e para o cômico. O bar lotou. Só o garçom não assistia – ocupadíssimo.
- Então, colega, pra que você se convença, vou representar o Capitão Zeca Diabo – lembra-se?
- Vamos ver, faça a cena. Já que todos aqui lhe compram como ator.
- Mas você vai ter que fazer o prefeito Odorico Paraguassú. Você consegue, figurante. Acredite.
Começaram ambos a fazer seus papeis. Meia hora de riso geral. A turma aplaudiu calorosamente. O falso pedincho de araque passou o chapéu. Todos contribuíram ... uns duzentos reais.
Saíram juntos. A cerveja e o tira-gosto ficaram por conta da casa.
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- Ei, cara! Você me pediu esmola há pouco, na porta do banco. Tá aqui, bebendo cerveja numa boa
- Eu?! Assim o senhor me ofende, professor. Por favor.
- Como não?! Me lembro bem da sua cara, rapaz. Você é um falso pedinte, fingindo necessidade. E eu, bobo, coração mole ... você devia ser preso, safado.
- Doutor, o senhor está me insultando.
- Então, o que você me diz, canalha? O-que-vo-cê-me-diz?
- Procure entender, autoridade. Eu sou ator. O senhor já viu o Herrison Ford... o senhor sabe quem é ... o Indiana Jones. O senhor acha que ele é arqueólogo? Ele é ator, excelência, e ganha milhões. De dólares, majestade ... fingindo. Eu finjo ser mendigo ... só isso. Não tenho direito a cachê, nem tenho produtor, diretor, essas coisas - ainda. Recebo a bilheteria diretamente. Sabe como é. Assobio e chupo cana.
- Mas o Indiana Jones é do cinema. E você, seu pedinte de araque.
- Sou ator de rua, doutor. Mambembe.
- Bonito, rapaz ... você me enganou ... é isso.
- Sou razoável, meu rei. Bonito mesmo é o Rodrigo Santoro. Que, aliás, ficou famoso e rico fingindo ser louco. Louco e bicha – coisa horrorosa, vocês não acham?
- É, mas lá se tratava de ator consagrado. E você, quem é?
- Sou aspirante, meu ídolo. E feio, fazer o quê. Mas o Grande Otelo; o senhor sabe quem foi Grande Otelo? Um cara feio pra cacete, que fez papéis engraçadíssimos e virou celebridade.
- Além de ator – de intérprete, não, de falso comediante, ainda é bom argumentista.
- Obrigado, companheiro, nada melhor do que ser reconhecido profissionalmente. Vejo que você também engana. É do ramo e eu duvidei de sua arte.
A esta altura, o debate que se iniciou como uma repreensão, resvalou por uma briga com xingamento e ia se encaminhando para um acordo, já tinha uma platéia de não sei quantos. Sabe como é cidade grande. Tem sempre platéia para o bizarro e para o cômico. O bar lotou. Só o garçom não assistia – ocupadíssimo.
- Então, colega, pra que você se convença, vou representar o Capitão Zeca Diabo – lembra-se?
- Vamos ver, faça a cena. Já que todos aqui lhe compram como ator.
- Mas você vai ter que fazer o prefeito Odorico Paraguassú. Você consegue, figurante. Acredite.
Começaram ambos a fazer seus papeis. Meia hora de riso geral. A turma aplaudiu calorosamente. O falso pedincho de araque passou o chapéu. Todos contribuíram ... uns duzentos reais.
Saíram juntos. A cerveja e o tira-gosto ficaram por conta da casa.
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Comentários
perfeito!
Abraço